domingo, 31 de outubro de 2010

Os retalhos do mrvadaz


Por volta das seis horas da manhã, com a lua cheia e a brilhar calmamente no céu, íamos aproveitar para antecipar as moscas que incomodam os animais ao nascer do sol. Segurando o balde na mão esquerda, meio sonolento, ouvia o meu pai a assobiar uma estranha canção melancólica que nunca tinha ouvido na minha vida. Com medo de tropeçar violentamente nas pedras e, ao mesmo tempo, magoar as feridas nos dedos dos pés que iam sarar, levantava os pés bem altos entre bordolegas machos e nhera sakedo mas sentia a dor que os orvalhos humidificavam as cascas das feridas dos dedos fanados. O meu pai com um ar muito atento, começou a observar o céu e as estrelas que pareciam brincar entre si ou dançar lambadas com dentes até às orelhas, deixou de assobiar, entre um respirar suave, virou para mim e disse:

-Estás a ver o Camilo Nhu Santiago?
-O quê? Camilo Nhu Santiago?
-Sim, aquelas riscas que estão a aparecer no céu por cima daquelas árvores, apontando para o céu com o indicador direito. Continuou a dizer:

-Este ano é bom, vai chover e vamos ter azágua. Eu sem perceber o quê que ele estava a falar e meio chateado por ter acordado cedo, acordei mesmo quando o Burro Branco começou a zurrar e o Mundo Sábi respondeu zurrando acompanhado de vários peidos. Tive um susto que até tropecei mas o meu pai não percebeu da minha queda porque estava concentrado a explicar a sua matéria preparada ao longo dos vários anos vivendo entre Bidela e Aguada. Ele continuou:

-O Camilo Nhu Santiago quando a esta altura do ano estiver com rabo em direcção à Trindade, na lua cheia, o ano vai ser bom porque no virar da lua, ele vai pôr o rabo em direcção à Cidade Velha e vai chover. Qualquer um pode semear, vai haver milhos e feijões abundantes.

Eu não estava muito atento à conversa do meu pai, soltei o bezerro que estava com vontade de mamar, ele foi directamente à sua mãe que começou a lamber-lhe com carinho e cheirar o seu rabo. O meu pai amarou o bezerro na pata da frente da Formosa e começou a mugi-la enquanto eu segurava bem firme o balde para poder ter “leite dormido” no pequeno-almoço antes de levar os animais para a Casa Nha Bina pastarem. Enquanto o bezerro tentava fugir, de vez em quando, a Formosa em jeito de afugentar as moscas, batia-me com o rabo na orelha ou cheirava os meus cabelos da cabeça, lambendo-os como se eu fosse o seu filho. Sentia-me os arrepios no corpo porque parece que as vacas têm espinhos na língua e até doía quando a língua apanha a testa ou outras partes que não têm cabelos. Depois de tirar o leite, o meu pai soltou o bezerro, levei o balde para a casa onde encontrei a minha irmã a refogar a cachupa onde o bule estava cheio de café para tomarmos o pequeno-almoço. Por essas horas chegavam os meninos de Achada Baixo com os seus animais onde levávamos para pastar.
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3 comentários:

  1. Retalhos... fez-me lebrar outros retratos ambulantes, un rapaz ratorku, na largu, ta spera pasa: ~- "E bo minina, bu ka ai ta ruspondi, enton bo e ratadju!".
    - Ka faita-m ratadju e bu m...- era konbersu ki kreda...
    Ratadju me, mas ka fetu pa djunta ku mi!

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  2. Hahahaha, esta foi boa!

    Volta manenti Anónimo di 31 de Outubro de 2010 !

    Abc!

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