Estávamos, no Centro Nacional de Apoio ao Imigrante(CNAI), a tentar perceber o que faziam aqueles Mediadores Culturais que nos atende para dizer que, além dos habituais documentos actualizados ou não, masoquistamente, temos que confirmar o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras(SEF) que os nomes dos nossos pais e das nossas mães são exactamente os mesmos que há 6 anos vimos dizendo, e dar-nos uma outras senhas; ou melhor dizendo, estávamos no SEF. Não aquilo é CNAI!
É que, no Porto, um imigrante pode ir pedir ajuda no CNAI e ficar preso no SEF lá dentro. Parece tchacota mas não é.
Éramos sardinhas enlatadas num pequeno quarto da esquina na Rua do Pinheiro(?) cuja rua cheira a pocilga e lá dentro falava-se os crioulos cabo-verdiano e bissau-guineense, chinês, árabe, inglês, português e outras línguas que não conheço dos países do leste. Éramos gentes de toda a casta que se podia imaginar com hábitos diferentes, obviamente notava-se com algum desconforto os diferentes cheiros e calor que se fazia lá dentro; algumas crianças choravam, outras, com energias para dar e vender, faziam birras, brincavam, gritavam. Começou a fazer filas na rua porque já não cabia mais pessoas lá dentro.
Ciente de que não ia à faculdade naquele dia porque ir ao SEF é sempre um dia perdido, como eu tinha senha nº42, a média de atendimento era cerca de 30 min por pessoas, já tinha lá estado há mais de 2h, ainda atendiam o nº12, resolvi refrescar os olhos lá em baixo.
Na saída encontrei um velho conhecido ao pé da máquina com a senha nº63, com um largo sorriso cumprimentou-me:
- Mo ki bai mós? Dja dura nka odjau!
- Nsta pa li ta distranka. Bu sta perdido mós!
Por breve momentos, actualizamos as nossas conversas e falamos um pouco sobre Cabo Verde, perspectiva para o regresso e alguns futuros planos, despedimos e dei comigo sentado num banco meio sujo na Praça da Trindade com três pombos curiosos que procurava se tinha algo os oferecer. Tirei a caneta da mochila, peguei numa folha e ajeitei as pernas, comecei a escrever: "Praça velha esquecida num recanto da cidade... ", de repente chegaram dois turistas com a máquina de filmar, virei a cara e dei com os olhos dentro da porta escancarada da igreja onde estava escrito: 'soli deu et gloria'.
Meio confuso, embalei-me de novo no papel.